Ceifeiras de Entradas                                                   
São três caminhos convergentes no largo da moda em 
feminino. Uma trilogia,  de espaço, 
melodia e ser que congrega , pelo menos, metade, de todo o nosso imaginário 
cultural. E esta mesma trindade, esteve desfeita durante décadas. Com a 
industrialização e a mecanização agrícolas, o campo deixou de absorver o 
trabalho braçal nas ceifas, nas mondas ou na  
apanha da azeitona e pouco a pouco, foi-se  despovoando. 
Mudaram-se os hábitos  
de vida de um  povo que cantava, 
nas idas, durante e no regresso do trabalho. Os homens continuaram a dar largas 
ao seu gosto pelos descantes quando nas tabernas se juntavam ou em grupos se 
reuniam, mas as mulheres, remetidas à solidão de casa, deixaram de ter ambiente, 
faltaram-lhes as vozes, para prosseguir a moda. 
E 
assim foi durante anos, décadas.
Acabados os bailes cantados pela modernidade emergente 
das tecnologias sonoras, extintos os trabalhos no campo, as mulheres deixaram de 
ter espaço na vida social, para nela exercerem o seu gosto, o seu saber, a sua 
necessidade de interpretarem colectivamente o 
cancioneiro.
Prosseguiram os homens o seu afã pelo cante. Cada vez 
menos no trabalho, só às vezes nas vendas, praticamente, só dentro dos grupos 
corais.
E 
com o passar dos anos, à conta de tanto se ver só cantar os homens, havia já 
quem afirmasse que o cante alentejano era pertença deles, era, em suma, um 
exclusivo dos corais masculinos.
Mas eis , senão quando, a partir do inicio da década de 
oitenta, aqui, ali e acolá, as mulheres foram conquistando a liberdade de 
assumirem, também elas, um papel activo na pratica regular do cantar, integradas 
em estruturas organizadas, à semelhança do que os homens haviam feito e 
faziam.
Em termos sócio-culturais, este foi o grande salto, a 
grande ruptura, a  revolução vencida 
pelas mulheres do nosso povo, negando a razão àqueles que em nome da tradição, 
as prendiam  à condição de pessoas 
desprovidas do direito de se juntarem, de se organizarem, de publicamente  assumirem o protagonismo bastante para 
cantarem em qualquer lugar a  sua própria 
tradição.
E 
hoje, passadas menos de três décadas, até já nos parece impossível que algum 
dia, em qualquer tempo, não pudessem existir coros femininos, pela circunstância 
das mulheres terem vivido, pessoal e socialmente proibidas de se juntarem em 
grupos para cantar a moda, como dantes o faziam, integradas nos ranchos das 
mondas e das ceifas, nas idas e nas vindas dos 
campos.
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