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terça-feira, 24 de novembro de 2015

Crónicas do Alentejo (By Susete Evaristo)


CRONISTA - SUSETE EVARISTO - 1ª CRÓNICA
Crónicas do Alentejo - Iniciativa do Grupo do Facebook "Imagens do Alentejo"
AS ANTIGAS FEIRAS DO ALENTEJO – O BONECO OCTÁVIO

Não me lembro quem nem onde se comprou, creio mesmo que tinha a mesma idade que eu.
Também não sei se foi ideia minha ou, de quem terá sido “baptizar” o boneco com o nome de Octávio; sei que foi o meu primeiro boneco. Era de celuloide, chique para a altura, pois a maioria das crianças apenas tinha bonecas de trapos ou de papelão.
Sei que o meu Octávio, com o passar dos anos, foi perdendo, hoje as pontas dos dedos, amanhã a ponta do nariz, num outro dia a barriga e eu sempre a fazer-lhe operações cozendo-o com linha branca, até que já não tinha ponta por onde se lhe pegasse e eu sentia-me muito triste, pois já não sabia a maneira de o ajudar.
A feira anual estava à porta; não era uma feira como estas feiras de agora, onde só se vendem roupas, sapatos e outros produtos baratos, provenientes da China ,os quais apenas resistem a uma utilização, depois só têm um caminho: o lixo.
Não, naquele tempo as feiras eram muito mais que isso. Tinham carroceis, carrinhos de choque, o poço da morte, onde os ginastas faziam acrobacias com motos; havia ainda circos com palhaços que nos faziam rir a bom rir, mesmo que as suas brincadeiras de tão usadas e gastas, já tivessem barbas; trapezistas elegantes nos seus fatos brilhantes, capazes de voar, quais pássaros exóticos, de trapézio em trapézio sem cair e sempre a sorrir, como se fossem naturais todos aqueles movimentos.
Além disso, as feiras tinham,também:barracas de pêros deliciosos, com um cheiro que se adivinhava muito antes de sequer avistarmos a feira, algodão doce, pinhoada, torrão branco e um sem número de outras gulodices; mas...
Mas tinham também barracas de quinquilharia e bugigangas. Estas sim eram especiais, porque havia daquelas em que as crianças se deleitavam, eram as de brinquedos. Havia brinquedos para todos os gostos: carros, carrinhas e carretas para os rapazes, bonecos e bonecas de todos os tamanhos e feitios para as meninas.
A minha mãe, sabedora da minha tristeza sobre o estado de doença em que o meu Octávio se encontrava, disse-me um dia que, logo que a feira chegasse, íamos levar o Octávio, pois na feira havia um senhor, que era uma espécie de médico de bonecos, que sabia arranjar-lhe a barriga, o nariz e as pernas. Foi de tal forma convincente que eu concordei.
Chegado o dia de feira lá fomos nós, eu com o Octávio ao colo com muito cuidado porque ia ser operado. Já na barraca das bonecas, os meus pais disseram à minha irmã que me levasse a ver o macaquinho que ali mesmo ao pé fazia das suas.
Eu não queria ir, queria assistir à operação do Octávio porém, o senhor disse que o tinha de levar lá para dentro e enquanto o arranjava era melhor ir ver o macaquinho.
Em menos de cinco minutos o Octávio ficou como novo! É certo que o nariz era diferente, também tinha engordado um pouco mas, era o Octávio e eu estava contente por voltar a ter o meu boneco, com nariz e sem aqueles buracos na barriga.
A feira passou, passou o Verão e quando chegou o Inverno, uma manhã achou a minha mãe que estava na hora de guardar as roupas de verão, trocando-as por roupas de inverno.
Abriu a gaveta da cómoda sem se lembrar que colocara lá bem no fundo, o velho boneco partido que tinha sido substituído por um igual, isto é, igual não era que eu bem lhe tinha notado as diferenças mas....
Não imaginam como fiquei, toda eu tremia, afinal o meu Octávio estava ali; o outro não passava de uma cópia, chorei de felicidade abracei-o, beijei-o e nunca mais o larguei.
Ao outro, “baptizei-o” como Octávio II mas a minha perdição e todo o meu encanto era pelo primeiro.
Quando cresci guardei-o dentro de uma caixa de sapatos colocando-o no guarda-vestidos.
*************
A última vez que o vi em casa dos meus pais, já estava casada e com filhos.
Não sei o que foi feito daquele boneco, sei que ainda hoje me traz gratas recordações.
Susete Evaristo
01/10/2015




Autor das Fotos:  Eduardo Teixeira Pinto

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