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terça-feira, 8 de novembro de 2016

O que é para mim ser Alentejano...


- Bom dia, queria um café se faz favor.
- Bom dia. Com certeza. Você é Alentejano, não é?
- Sim, sou! Sou de Ourique!

É assim que começam a grande maioria das minhas conversas num café em Lisboa, onde trabalho. Pelo meu carregado sotaque poucas pessoas precisam de mais do que umas poucas de palavras para identificar onde nasci e fui criado. No entanto, para mim, ser Alentejano é mais do que simplesmente ter nascido no Hospital de Beja ou ter passado os primeiros 17 anos da minha vida em Ourique. Para mim ser Alentejano faz parte de quem sou, da minha personalidade e da minha identidade.

Como a identidade é uma busca pela unicidade, a minha identidade Alentejana ficou mais vincada quando saí do Alentejo e de Portugal, quando percebi que o Alentejo era único: desde as casas caiadas com as suas barras, dos montes, do vocabulário (não imaginam o quão é divertido ensinar a um Lisboeta o significado da palavra “embezerrado”), do sotaque, e claro, do campo. Não posso dizer que sou um homem do campo, pois com pena minha me afastei um pouco dele na adolescência após lhe ter sido próximo na infância pela boa influência dos meus pais. Mas posso dizer que ainda hoje sinto um resto de proximidade com os animais do campo, com a sua inocente lealdade e de quando em vez vou visitar alguns dos que a minha família tem a graça de possuir. Posso também dizer que não há lugar que mais ame que o campo do Alentejo, que para mim é o mais belo de todos os campos: dourado e seco, com uma azinheira plantada no seu seio, cuja solidão é triste mas alegre ao mesmo tempo, como tantas vezes é o próprio Alentejo. E ser Alentejano é amar e guardar no coração todas estas coisas que são o Alentejo. Ser Alentejano é guardar no coração o Alentejo.

Noto que a reação das pessoas ao eu ser Alentejano é normalmente positiva, parece que existe uma certa empatia com a nossa gente. Até já me disseram que “os Alentejanos são todos boas pessoas!”. Uma das razões pelas quais existe tal otimismo em relação à nossa gente é porque de alguma forma os Alentejanos são pessoas de virtude. Criado numa família tradicional, sempre me ensinaram a ser humilde, educado, hospedeiro e leal. A amar o compromisso e a ser trabalhador. Muito trabalhou e sofreu a gente da nossa terra, por vezes esquecidos pelo resto do país, mas mesmo assim o espírito de partilha e amizade não tem aqui faltado. Pelos seus valores, os humildes Alentejanos conquistaram a simpatia de Portugal. Ser Alentejano é ter valores.

Mas o património imaterial do Alentejo não se fica pelos valores, estendendo-se também às  tradições e cultura. Infelizmente vivemos num tempo em que por vezes se desvirtua o que é antigo apenas porque o é. Não digo que todas as tradições do mundo devam continuar só porque são tradições, pois a moral está acima da tradição, mas vejo virtude na continuidade daquilo que já está construído e que tem valor. E a cultura Alentejana tem grande valor: pois por mais pratos que tenha experimentado nada supera a açorda Alentejana que aqui desde pequeno como, e por mais vozes que tenha ouvido nenhuma toca a alma da mesma forma que a do cante Alentejano. Estas e outras coisas constituem o património da nossa terra, que os nossos antepassados foram construindo. Devemos valorizar a nossa cultura e as nossas tradições. Ser Alentejano é valorizar a cultura e as tradições.

O meu último nome, tal como muitas pessoas de Ourique, é Guerreiro. Quando era mais novo, achava-o demasiado comum por todos muitos o terem, e preferia até utilizar o meu outro apelido, Emídio. No entanto, hoje é com orgulho que assino com o nome Guerreiro, porque é um nome de Ouriquense, de Alentejano. Assim, por muito longe que esteja de casa o Henrique será sempre Guerreiro, sempre Ouriquense, sempre Alentejano. Porque connosco para todo o lado só levamos certas duas coisas: o corpo e a alma, e para mim ser Alentejano está marcado nos dois, no corpo e na alma. E levo o Alentejo para onde quer que vá, pois no fim de tudo, ser Alentejano é ser Alentejo em todo o lado. Ser Alentejano é ter alma Alentejana.
Texto copiado do site: http://www.radioourique.pt/



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