Junho é mês de alhos, aquela que é a cultura mor dos quintais.
Durante o fim de semana, foram arrancados os alhos e alhas deste ano. Uma tarefa revestida por alguma dificuldade, uma vez que a terra se encontrava tão macia quanto os adornos decorativos da cabeça de um bovino já de idade avançada, o que eventualmente poderá ser causa para a formação de calosidades nas extremidades dos membros superiores.
Os alhos são uma das culturas mais fáceis e menos trabalhosas que podemos realizar, apesar do ciclo cultural ser longo, pois são plantados em Novembro/Dezembro e recolhidos em Junho/Julho, São cultivados em regime de sequeiro e para além de umas mondas e sachadelas, pouco mais nos exigem. Há ainda quem opte por cobrir a terra com cinza, um fertilizante que para além do azoto, que desaparece integralmente com a queima da matéria orgânica, e do enxofre, que se volatiliza, possuí todos os outros nutrientes na proporção que a planta necessita. Apesar de serem tolerantes à sombra e solos pobres, beneficiam da exposição solar, frio nos dias curtos de Inverno, o que favorece o desenvolvimento das raízes, chuvas regulares, sobretudo na Primavera, bem como de solos leves e bem drenados, adicionados com alguma matéria orgânica. Quem idealize que poderá ter sucesso nesta cultura em solos pesados e mal drenados, argilosos ou que retenham a água em excesso, talvez seja melhor desistir dessa opção, pois o mais provável será a obtenção de um mau resultado.
O ano foi bastante profícuo para esta cultura, sendo os resultados obtidos amplamente satisfatórios. Foram plantadas três variedades, duas de alhos e outra de alhas (alho elefante). Quanto aos alhos, a primeira trata-se de uma variedade de alho roxo com cabeça fechada, de sabor super agressivo, ideal para quem gosta mesmo do sabor a alho. A segunda é um alho ligeiramente menos agressivo que o primeiro e cuja cabeça não fecha, separando-se os dentes ao mais simples toque, são assim o ideal para quem não aprecia a tarefa de separar os dentes, sendo menos trabalhoso nesse sentido.
Por fim temos as alhas, cujo nome é alho elefante, mas à qual prefiro atribuir a designação tradicional pela qual sempre os ouvi chamar, por isso são "alhas". Trata-se de uma variedade em tudo especial para mim, carregada de simbolismo e saudosismo, à qual dedico todo o meu esforço por manter, preservar e dar continuidade, o que encaro como um dever moral, sobre o qual tenho por vezes alguma dificuldade em me exprimir. Estas alhas são um legado, pois foram cultivadas pelo meu Avô neste quintal ano após ano, sem nunca perder a variedade. Reparem, que os alhos não são sementes que se guardem numa gaveta e que possam manter a capacidade germinativa após alguns anos, pois para manter a variedade será sempre necessário voltar a plantar todos os anos. Recordo-me de já as ver nos meus tempos de criança, as quais são de forma ininterrupta aqui cultivadas seguramente à mais de cinco décadas, repito, ano após ano, daí o meu emotivo orgulho nesta perseverança.
Por incrível que pareça não são um parente do alho comum, mas sim do alho-porro ou alho francês, com a particularidade de formarem bolbos. Apesar de na fase inicial o sabor ser quase tão agressivo quanto o dos alhos, este vai gradualmente adocicando, porém possuem uma longevidade superior, resistindo por mais tempo em boas condições sem ficarem "xoxos". São óptimas para quem não goste do sabor muito intenso a alho, mas podem ser utilizadas para os mesmos efeitos, para assar no forno, ou ainda para os fins cuja inspiração culinária o permita.
Uma característica particular reside no facto de alguns não formarem dentes, sendo compostos por uma cabeça única. A razão desta diferença é consequência de desenvolverem ou não o espigo de sementes, pois é o espigo que fará dividir o bolbo, normalmente em cinco ou seis partes. As que não formam espigo são inteiras e relativamente à parte aérea, na altura do arranque já tudo secou, provocando que por vezes nos escapem algumas.
Importa salientar que apesar do espigo de sementes, a propagação não é realizada por essa via, mas sim através do plantio dos dentes. As inteiras vão logo para o consumo, não sendo rentáveis para propagação, pois seguindo a lógica matemática, uma cabeça inteira gera apenas uma nova planta, enquanto uma com cinco dentes gera cinco plantas, ou seja, o quíntuplo.
Certos exemplares atingem dimensões generosas, assemelhando-se a uma pequena cebola, principalmente os "malteses", designação atribuída aos que inadvertidamente não são recolhidos e brotam de forma espontânea ás primeiras chuvas outonais.
Posto isto, a realidade é que foram recolhidos alhos que seriam suficientes para três ou quatro anos. Contudo, como será bem mais agradável viver em abundância que em escassez, e morrer, sempre será melhor de barriga cheia que com ela vazia, este é o menor dos males.
Talvez a solução, passe por confeccionar quatro a cinco vezes por semana uma energética, revigorarante e desenjoativa alhada de cação !
Texto e fotos da autoria do nosso compadre Rui Delgado ( Vale Machoso- Gavião )
Sem comentários:
Enviar um comentário