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domingo, 7 de abril de 2024

domingo, 8 de outubro de 2023

Rostos- Tia Anica







 Ela esteve atrás do balcão de uma mercearia quase 40 anos.

Ele, tem as chaves de todas as igrejas e das portas de casa de muitos que tem em Vila Nova uma segunda residência ou uma ausência temporária.

Por gostarem de convívio e, sobretudo, por gostarem de ajudar o outro, estão a receber agora muita da bondade e da alegria que semearam.

Ela é Ana da Conceição Marques, a Anica.
"Eu nasci aqui, em Vila Nova. O meu marido é que veio cá parar. Ele é de Ourique, conheci-o há 55 anos. Na altura a minha mãe era modista de senhora. E eu trabalhava numa alfaiataria aqui na rua éramos vinte e tal mulheres. Mas só fazíamos casacos e coletes. As calças eram feitas em casa, e era na altura que se usava os botões. O alfaiate metia as calças, metia as linhas, metia os botões, metia tudo. E nós levávamos aquilo para casa e terminávamos as calças. Eu assim fiz, levei umas calças para fazer e tinha de as acabar e levar ao outro dia de manhã. E quando eu estou em casa e vou para acabar o fato vi que não tinha botões.
O alfaiate já tinha a loja fechada, mas havia outra aqui ao lado, mesmo ao pé do centro de saúde. Era uma loja grande e também já estava fechada. Mas desta vez bati à porta. “Oh senhor Manuel desculpe lá, a ver se me desenrascava… Ia acabar estas calças, esqueceram-se de meter os botões, ou eu os perdi, não sei … Ajude-me lá”, dizia eu. O certo é que este homem, que havia de ser meu marido, estava lá a vender tecidos.
A esposa do senhor Manuel fazia roupa para ela e para a filha e diz-me “olha ainda bem que chegaste, que preciso que me ajudes aqui a escolher um tecido de para fazer umas coisas para a Manuela e uma saia-calça para mim…”. Eu lembro-me de ouvir o meu marido dizer "não gosto nada de ver as mulheres de saia calça". Ele não se lembra, mas eu lembro-me. Eu pensei cá para mim: “é mesmo parvo!”.
Vim para casa e nunca mais me lembrei dele.
Mas no outro dia de manhã, quando passo aqui no largo das Laranjeiras, vejo um carro e uma pessoa a apitar-me. “Uma apitação. Quem é que será?”, pensava eu. Era ele. O que é certo é que ao fim de seis meses já estávamos casados. "
Ele é Octávio Canhestro Marques.
"Trabalhamos muito, anos e anos e anos. Eu tinha de ir a Évora às terças, quintas e sábados, às três da manhã para vir buscar as hortaliças. Era no Largo de São Francisco, junto à capela dos ossos, que se fazia o mercado. Chegavam os carros do Algarve, com as hortaliças fresquinhas e as frutas. Foram muitos anos assim. Depois é que deu para começar a ir mais tarde, só lá para as cinco da manhã.
Trabalhamos muito e tínhamos muita freguesia. Eu, como andava para trás e para a frente, às vezes até parecia a ambulância da vila.
Uma vez estava em casa e vêm -me bater à porta o Virgulino, a dizer que a mulher estava aflita... Eu fui na gáspea até Évora, felizmente já estava dentro do hospital quando o bebeu nasceu, mas estava a ver que me nascia no carro.
É verdade é que as pessoas confiam em nós. Tenho a chave de todas as igrejas porque faço parte da Fábrica da Igreja. Mas também tenho cá em casa um molho de chaves de casa de várias pessoas daqui. Pessoas que têm casas cá, mas vivem fora. E a gente vai ver a luz, vai ver a água, vai ver se está tudo bem e o que mais for preciso."
Leiam a reportagem acerca do quotidiano de Vila Nova da Baronia e de Alvito em

quinta-feira, 5 de outubro de 2023

Rostos- Rama Verde








 Diogo Tomás tem agora 23 anos, mas quando se dirigiu ao presidente da Junta de Freguesia de Vila Nova da Baronia aa pedir-lhe para os ajudar a fundar um grupo de cante tinha pouco mais de 14. Os Rama Verde são uma coletividade que pertence à Sociedade Filarmónica Vilanovense (Vila Nova da Baronia). Foi quando o cante foi elevado a património imaterial da Humanidade. E os miúdos acharam que podiam, e deviam, fazer alguma coisa. Hoje, há em Os Rama Verde miúdos e graúdos.

O grupo é ensaiado por Bruno Tasanis que, tal como João Monte, estavam num outro grupo coral, o Papa-Borregos, fundado há mais de 50 anos em Alvito. Mas quiserem ambos ajudar a resgatar e a preservar as modas de Vila Nova da Baronia.
“Somos um grupo dos oito aos 80”, explica João Monte, mestrando em desporto de alto rendimento e professor de cante em escolas básicas do concelho. “Muito feliz com o grupo. Já somos quase 40 e temos muitos jovens entre nós. E gente com experiência também, que o grande AP Braga [cantautor de intervenção, que lançou dois discos ainda antes do 25 de abril] também se juntou ao grupo”, diz João Monte.

Testo e fotos: Luísa Pinto, https://www.facebook.com/rostosdaaldeia

terça-feira, 3 de outubro de 2023

Rostos - Fora da Caixa







 O Fora da Caixa é um café reaberto numa velha mercearia no centro de Vila Nova da Baronia pela mão de Hugo Calca.

Hugo tem apenas 44 anos, mas já fez muita coisa na vida. Foi padeiro, dono de bares, empresário em restaurantes. Agora é o único funcionário do Fora da Caixa, um café que também tem pastelaria e refeições ligeiras, que aluga bicicletas elétricas e quer alugar caiaques, que oferece bom ambiente e boa disposição.
“Estou muito feliz com este espaço. Foi a minha bisavó que abriu isto em 1915 e tinha aqui a melhor loja de Vila Nova da Baronia. Vendia mercearia, loiças, tecidos, tabaco, calçado. Em 1960 passou a café; estava para ser uma taberna mas, como a escola primária ficava aqui em frente, o Estado Novo não deixou. Ficou aqui o café do Sr. Domingos. E assim era conhecido, até eu o reabrir, tentando recriar o interior daquela primeira mercearia: tudo o que vemos dentro desta mercearia é de 1929. E isso orgulha-me muito”, conta.
Hugo Calca nunca quis, ou pensou, sair de Vila Nova da Baronia. E agora, que está casado com uma cabo-verdiana há quase 18 anos, diz que é ela quem não quer sair dali.
“A única coisa que ela me diz é ‘não saio daqui para lado nenhum, porque aqui tenho tudo o que necessito’. Temos uma filha com 12 anos, e agora a bebé. Elas têm autocarro quase à borla para as piscinas (o que se paga é mesmo simbólico). Tens refeições à borla na escola, tens centro de saúde – que é muito importante -, tens biblioteca, correios, lojas, não tens trânsito. Por mais stress que apanhes num café a trabalhar, a encheres a cabeça, chegas a casa abres a janela do teu pátio ou do teu quintal, ouves os passarinhos e desanuvias de tudo. Ficas bem. Ficas melhor contigo. E isto é maravilhoso”, argumenta.
O espaço abriu em finais de 2022 – “na mesma altura em que nasceu a minha segunda filha”, avisa Hugo, como que a assinalar o marco, duplamente inesquecível, mas também a justificar as prioridades que, na sua cabeça, estão bem definidas. “Quero ter tempo de chegar a casa e ver a minha filha crescer”, assume.

Texto e fotos: Luísa Pinto, Rostos da Aldeia.

segunda-feira, 2 de outubro de 2023

Rostos- Ervas Aromáticas






 Rita Valente nasceu em Vila Verde de Ficalho mas mudou-se para Alvito em 2012. Foi lá que escolheu viver, divulgar património, construir uma empresa, criar um filho.

É formada em património mas é na agricultura e no cultivo sustentável de plantas aromáticas que ocupa a maior parte do seu tempo profissional. Fundou o projecto Folhas - Culturas do Alentejo, de onde exporta ervas aromáticas e medicinais para vários países da Europa. Fá-lo em modo biológico - "porque temos de devolver à terra o tanto que elas nos dá" - sem nunca sacrificar o que, pessoalmente, lhe dá mais alegrias e satisfações: o tempo de qualidade que passa com o marido, filho e amigos.
Ouvir Rita Valente é ouvir um tratado de serenidade. E convicção.
"Eu gosto muito de ser do Alentejo, de estar no Alentejo, de estar aqui em Alvito. O melhor de viver por aqui é o dia que rende sempre muito mais do que em qualquer outro sítio. Parece que o tempo estica. E esta comunidade abraça quem vem de fora. Eu senti-me bem recebida.
(....)
Eu procuro fazer muito trabalho com a comunidade, sobretudo com crianças e idosos. A primeira sensibilização que procuro fazer é para o que há aqui em Alvito, para valorizarem aquilo que é da terra. Gosto de sensibilizar as pessoas para as muitas coisas boas que temos no nosso território. Seja património, seja a natureza, seja os costumes, sejam as pessoas de cá. É preciso dar valor também às pessoas de cá, para combater aquela coisa de que o que está fora é que é bom".

domingo, 1 de outubro de 2023

Rostos - Cante







João Monte tem 25 anos e dois amores. O desporto, caminho que escolheu para a vida académica e profissional; e o Cante, paixão que alimenta e que distribui, seja mantendo o cante tradicional no grupo Rama Verde, seja reinventando o cante com o grupo Oh Laurinda. É professor de cante nas escolas, porque vai a todas as batalhas que permitam salvaguardar a velha tradição.
Está tudo aqui:

Texto e fotos: Luísa Pinto, https://www.facebook.com/rostosdaaldeia

sábado, 30 de setembro de 2023

Rostos - Rota do Fresco







 Catarina Valença Gonçalves é uma visionária.

Nasceu nas Avenidas Novas, em Lisboa, o gosto pela arte levou-a ao Alentejo, e o gosto pela pintura mural a fresco fixou-a no Alvito, em Vila Nova da Baronia. 
Já é mais alentejana do que lisboeta, apesar de se considerar uma mulher do mundo, com elasticidade suficiente para fazer doutoramentos na Sorbonne e ter aulas de piano, ao mesmo tempo que vive uma vida despojada e condiciona os seus dias à força da luz do sol e aos caprichos da terra.
É ela a autora da Rota do Fresco, aquela que foi a primeira Rota de Turismo Cultural em Portugal, criada há exatos 25 anos. 
E que se mantém até hoje. 
Podem ler o seu testemunho em : 

Texto e fotos: Luísa Pinto, https://www.facebook.com/rostosdaaldeia

domingo, 21 de maio de 2023

Já não há Verdemãs na Pega


 JÁ NÃO HÁ VERDEMANS NA PEGA

Muito longe vão os tempos em que este pequeno afluente do Azevel, nascido perto do Baldio e atravessando toda a freguesia de Monsaraz, corria por vezes caudaloso, arrastando consigo enormes quantidades de laranjas, das muitas hortas que havia nas suas margens e que caprichosamente abandonava no espraiar das águas, junto a Ponte dos Frades, onde a rapaziada as recolhia.
Recordo-me de ir à Pega à atabua, para tapar a serra da palha, de ir ajudar o Cacharamba a recolher o buinho para o fundo das cadeiras, de irmos apanhar o aloendro para enfeitar os mastros dos santos populares, mas aquilo que não me sai mesmo da memória, foi as vezes sem conta, que calcorriando matos e restolhos, munidos de uma improvisada rede de arrasto, que não era mais que um pedaço de rede com um pau em cada extremidade, que arrastada pelo fundo do pego apanhava as tão desejadas verdemans.
Tratando-se de uma ribeira que só de inverno corria, os pegos era o garante da continuidade de biodiversidade, de uma época para a outra, recordo-me do pego do porto da Lage junto à anta do olival da Pega, do pego dos Andorinhos e do pego da Rocha do Demo, que apesar do mau acesso eram os que devido ao fundo arenoso, permitiam melhores capturas de verdemans, isco tão ao gosto dos recém introduzidos no Guadiana, Achigã. Recordo com saudade a companhia destas lides, o meu amigo Manuel Rela e a paciência infinita do Ti Rela, que nos deixou dividir ao meio o tanque da rega, para aí criarmos as condições de um suposto pego para mantermos as verdemans em cativeiro.
Jámais esquecerei o pulsar de vida que eram em alguns casos estes pequenos charcos, aqui se recolhiam verdemans, pardelhas e até as indesejáveis sanguessugas e tudo o que de aquático se podia considerar, esperando a passagem do estio e aguardando por um novo ciclo.
Nas suas redondezas sequiosos por matar a sede se concentrava toda a espécie de aves entre rolas, cotovias, trigueirões, pardais, papa-figos, abelharucos e toda uma infinidade de espécies à época tão abundantes.
Hoje infelizmente a ribeira não corre os pegos não existem e JÁ NÃO HÁ MAIS VERDEMANS NA PEGA.
Texto: Isidro Pinto