Ela esteve atrás do balcão de uma mercearia quase 40 anos.
Ele, tem as chaves de todas as igrejas e das portas de casa de muitos que tem em Vila Nova uma segunda residência ou uma ausência temporária.
Por gostarem de convívio e, sobretudo, por gostarem de ajudar o outro, estão a receber agora muita da bondade e da alegria que semearam.
Ela é Ana da Conceição Marques, a Anica.
"Eu nasci aqui, em Vila Nova. O meu marido é que veio cá parar. Ele é de Ourique, conheci-o há 55 anos. Na altura a minha mãe era modista de senhora. E eu trabalhava numa alfaiataria aqui na rua éramos vinte e tal mulheres. Mas só fazíamos casacos e coletes. As calças eram feitas em casa, e era na altura que se usava os botões. O alfaiate metia as calças, metia as linhas, metia os botões, metia tudo. E nós levávamos aquilo para casa e terminávamos as calças. Eu assim fiz, levei umas calças para fazer e tinha de as acabar e levar ao outro dia de manhã. E quando eu estou em casa e vou para acabar o fato vi que não tinha botões.
O alfaiate já tinha a loja fechada, mas havia outra aqui ao lado, mesmo ao pé do centro de saúde. Era uma loja grande e também já estava fechada. Mas desta vez bati à porta. “Oh senhor Manuel desculpe lá, a ver se me desenrascava… Ia acabar estas calças, esqueceram-se de meter os botões, ou eu os perdi, não sei … Ajude-me lá”, dizia eu. O certo é que este homem, que havia de ser meu marido, estava lá a vender tecidos.
A esposa do senhor Manuel fazia roupa para ela e para a filha e diz-me “olha ainda bem que chegaste, que preciso que me ajudes aqui a escolher um tecido de para fazer umas coisas para a Manuela e uma saia-calça para mim…”. Eu lembro-me de ouvir o meu marido dizer "não gosto nada de ver as mulheres de saia calça". Ele não se lembra, mas eu lembro-me. Eu pensei cá para mim: “é mesmo parvo!”.
Vim para casa e nunca mais me lembrei dele.
Mas no outro dia de manhã, quando passo aqui no largo das Laranjeiras, vejo um carro e uma pessoa a apitar-me. “Uma apitação. Quem é que será?”, pensava eu. Era ele. O que é certo é que ao fim de seis meses já estávamos casados. "
Ele é Octávio Canhestro Marques.
"Trabalhamos muito, anos e anos e anos. Eu tinha de ir a Évora às terças, quintas e sábados, às três da manhã para vir buscar as hortaliças. Era no Largo de São Francisco, junto à capela dos ossos, que se fazia o mercado. Chegavam os carros do Algarve, com as hortaliças fresquinhas e as frutas. Foram muitos anos assim. Depois é que deu para começar a ir mais tarde, só lá para as cinco da manhã.
Trabalhamos muito e tínhamos muita freguesia. Eu, como andava para trás e para a frente, às vezes até parecia a ambulância da vila.
Uma vez estava em casa e vêm -me bater à porta o Virgulino, a dizer que a mulher estava aflita... Eu fui na gáspea até Évora, felizmente já estava dentro do hospital quando o bebeu nasceu, mas estava a ver que me nascia no carro.
É verdade é que as pessoas confiam em nós. Tenho a chave de todas as igrejas porque faço parte da Fábrica da Igreja. Mas também tenho cá em casa um molho de chaves de casa de várias pessoas daqui. Pessoas que têm casas cá, mas vivem fora. E a gente vai ver a luz, vai ver a água, vai ver se está tudo bem e o que mais for preciso."
Leiam a reportagem acerca do quotidiano de Vila Nova da Baronia e de Alvito em
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