Estremoz: Mercado dos barros integrado no mercado semanal, cerca de 1940.
Fotografia de Rogério de Carvalho (1915-1988). Arquivo do autor.
“O VASILHAME DE BARRO DE ESTREMOZ”
As olarias de Estremoz desde sempre produziram, todo o tipo de vasilhame destinado a uso doméstico, nomeadamente o destinado a conter água.
Dantes, todas as casas tinham na cozinha, um poial dos cântaros, onde os tamanhos mais correntes eram “a terceira” (15 litros) e a quarta (10 litros). Aí se ia buscar à fonte ou ao poço, a água destinada ao consumo doméstico. Nos poiais, lá estavam gravados muitas vezes, a cruz e o signo-saimão, símbolos mágicos de protecção contra o mau-olhado e o quebranto. Estes símbolos podiam aparecer igualmente gravados nos cântaros ou nas suas tampas de cortiça.
Para além dos cântaros, existiam ainda recipientes para água de menores dimensões, como as bilhas, os moringues, as garrafas de água, os barris e os púcaros.
As bilhas (de 1 a 2 litros) e os moringues (1 a 3 litros) permitiam levar água à mesa da refeição. Já as garrafas de água (1 a 2 litros) eram mais destinadas a ter na mesinha de cabeceira, para uso nocturno. Quantos aos barris (1 a 2 litros), destinavam-se a ser usados em viagem ou levados para o local de trabalho, usando um cordel que os permitia transportar ao ombro ou a tiracolo. Eram também usados nos carros de tracção animal, protegidos por um invólucro tecido com esparto, num receptáculo existente no exterior do carro.
Em Estremoz, sempre houve três tipos de decoração do vasilhame para água:
- o riscado, de aspecto mais rústico, tendo colado meniscos convexos de argila, decorados com minúsculos seixos de quartzo;
- o polido, com uma decoração mais fina e requintada, que joga com o contraste entre a superfície baça e os motivos que foram polidos;
- folhas, bolotas e ramos de sobreiro, moldados em barro e colados à superfície, conjugados com algum polimento daquela.
Existem também recipientes em barro, vulgarmente conhecidos por “picassos”, com formas mais ou menos estilizadas: o peixe, o galo, a cabra, a mulher nua, a sereia, etc.
Antes da vulgarização dos frigoríficos, o vasilhame de barro era a garantia de se ter em casa, água fresca que nos permitisse dessedentar nos dias de Verão. O barro é poroso, pelo que a água contida no interior do recipiente, chega à superfície por capilaridade. Daqui se evapora por acção do calor, o que consumindo energia, faz baixar a temperatura no interior do recipiente. Este abaixamento de temperatura é directamente proporcional à massa de água evaporada e inversamente proporcional à massa de água contida na vasilha. Os cálculos revelam que ao evaporar-se 1 decilitro de água de um recipiente, que passe então a ficar com 1 litro dela, a temperatura desta baixa 5,4 º C. É a magia da natureza. E como é saborosa a água contida em recipientes de barro, sobretudo de barro novo, que se desfaz em fino pó.
A vulgarização dos frigoríficos deu uma facada de morte nos oleiros, que já tinham levado outra com a implementação dos recipientes de alumínio, a substituir a loiça vidrada. Entre nós só já há um oleiro, Jerónimo Lagartinho, que talvez venha a ser o último oleiro de Estremoz. A olaria estremocense está em risco de extinção. Não se pode fazer nada para o evitar? É que chorar lágrimas de crocodilo depois, é hipocrisia e não resolve nada.
Copiado do blog do compadre Hernâni Matos, http://dotempodaoutrasenhora.blogspot.pt/
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